A coruja e o coração

domingo, 19 de junho de 2011
Tiê esteve muito presente no meu player no ano de 2009, logo que lançou o disco "Sweet Jardim", adorei a voz calma e o tom melancólico de algumas canções. Por um tempo ela apareceu apenas esporádicamente entre as músicas que ouço, e agora encontrei o novo disco que ela lançou. "A coruja e o coração", a doçura da voz, desta vez acompanhada de bandolim e uns toques diferentes, mas certamente inconfundível.

Além das músicas autorais, Tiê fez uma versão de "Só sei dançar com você" da Tulipa Ruiz, que está ficando muito popular também, já que suas músicas estão tocando na MTV. A supresa fica por conta de uma inversão de papéis, no lugar de uma banda de forró de plástico acabar com uma música fazendo uma versão brega, Tiê deixou a música "Você não vale nada, mas eu gosto de você", de Calcinha Preta, "ouvível". Transformou em arte um lixo musical. Só Tiê mesmo.

A paulistana Tiê começa a cantar o disco "O Coração e a Coruja" em voz duplicada, como se existissem duas Tiês. "Na Varanda de Liz" faz referência à sua filha de 1 ano e inicia o segundo álbum em tempo de aconchego. A suavidade persiste, mas a sonoridade não repete a do independente "Sweet Jardim", de 2009. A primeira impressão em relação à tímida e introvertida estreia, é a de que Tiê encorpou.


A impressão se confirma a cada nova audição, e não é por menos. Entre os primeiros piados e os de agora, há uma gravadora multinacional (Warner) e a produção tarimbada de Plínio Profeta. O bicho-de-sete-cabeças do "mercado" às vezes faz bem aos indies, nestes tempos pós-derrocada da indústria, e esse parece ser o caso.


O que há aqui, acima de tudo, é uma adaptação geral de tom. Tiê veio com a onda folk subtropical que nasceu em Los Hermanos e virou efeito-manada após Mallu Magalhães. Paga o preço de pertencer à cena paulistana, onde nove em cada dez novos movimentos se sustentam em plataformas do "não" e do culto ao deprê à la rio Tietê. "Só eu sei/ o que é melhor pra mim/ às vezes é mais saudável chegar ao sim", ela afirma, noutra direção, em "Piscar o Olho", uma simpática e sorridente canção sobre... o final de um romance.

Inspirado nos pantanais norte-americanos, mas engrossado por caipirices de São Paulo e do Mato Grosso, o folk subtropical não abandonou de repente a música de Tiê. O que há é uma ampliação de horizonte, e o sol ameaça brilhar lá no final. Plínio Profeta toca banjo, cellos são acrescentados aqui e ali, Marcelo Jeneci traz sua sanfona cabocla (em "Só Sei Dançar com Você", de Tulipa Ruiz), Tulipa e Thiago Pethit fazem coro em pique de "Hits do Underground" (como diriam Miranda Kassin e André Frateschi). Sim, a música de Tiê está encorpada.

O texto do release do disco chama de "exótica" (por quê?) a releitura passarinha de "Você Não Vale Nada", do forrozeiro Dorgival Dantas, um sucesso pós-industrial maciço (e "brega", segundo o release) na interpretação grupo Calcinha Preta. Não há como não soarem deliciosos os versos "você não vale nada, mas eu gosto de você", mas Tiê segue a estratégia desgastada de fazer apropriação supostamente cool daquilo que não é nem quer ser cool. O violão flamenco, aciganado, é uma graça, mas não haverá quem consiga desabrasileirar Dorgival, nem Tiê - ainda bem.

Noves fora, o barquinho navega bem em "A Coruja e o Coração", mais para Tiê que para Tietê. Fortalecida e nutrida pela ponte indie-indústria, ela deixa acontecer o que talvez (tomara) aconteça com Mallu Magalhães quando ela adultescer. O temor de parecer o que é - caipira - e o esconderijo por trás da caipirice "chique" das terras de Bob Dylan é compartilhado por Tiê com Jeneci, Tulipa, Hélio Flanders e seu Vanguart, Céu, Thiago Pethit, Pedro Granato etc. etc. etc. Mas há de se dissipar, já está se dissipando. 


Site oficial: http://sweetjardim.wordpress.com
Myspace: http://www.myspace.com/tiemusica
Para comprar o CD: Clique aqui
Download: A Coruja e o Coração  
Entrevista e trechos de músicas:


Sweet Jardim (2009):





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